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Esportes
26/10/2020 03h22

Em alta, técnicos estrangeiros encantam com jogo ofensivo e se destacam no Brasil

Impulsionados pelo sucesso de Jorge Jesus no Flamengo em 2019, campeão nacional e da Libertadores, os dirigentes dos clubes brasileiros resolveram dobrar a aposta em técnicos estrangeiros nesta temporada e vêm colhendo frutos. Os três primeiros colocados do Brasileirão são comandados por um profissional de fora do País. O espanhol Domènec Torrent e o argentino Eduardo Coudet superaram algumas adversidades para levar Internacional e Flamengo ao topo da tabela, logo à frente de Jorge Sampaoli, que, em seu segundo ano consecutivo por aqui, vem novamente fazendo um trabalho competente, agora no comando do Atlético-MG.

Os três superaram as dificuldades relacionadas ao período de adaptação dentro de uma nova realidade, com calendário espremido e aspectos culturais diferentes, e contrariaram a lógica "resultadista" para brilhar e levar suas equipes às primeiras posições do torneio nacional. Mais do que os resultados positivos, eles foram capazes de implementar os seus conceitos de futebol e conseguiram fazer seus times desempenharem um futebol agradável. Todos são conhecidos pelo jogo ofensivo, organizado, de intensidade e que prioriza a posse de bola. Essa "invasão" não é algo novo, mas o País iniciou a temporada com o número recorde de treinadores estrangeiros. Apenas entre os times da Série A eram quatro profissionais "importados". Hoje são três.

"Em um país onde há tantos bons jogadores, implementar ataques é, para mim, muito alentador. Vir ao Brasil para recordar aqueles times do Brasil com tanta hierarquia e tanto ataque. Estou tratando de voltar um pouco na história", reforçou Sampaoli, em entrevista recente. "Pensamos muito mais em fazer um gol no adversário do que defender o nosso próprio. Teremos uma equipe que, onde quer que jogue, defenderá sempre a posse de bola", acrescentou.

"Tenho uma filosofia muito parecida à do treinador com quem trabalhei (Pep Guardiola) nos últimos dez anos. Gosto do jogo ofensivo. Prefiro ganhar por 4 a 3 e não por 1 a 0. É importante também para o torcedor. Gosto de ter a bola, de ser protagonista", explicou Domènec na sua apresentação no Flamengo.

Depois de demitir Vanderlei Luxemburgo, o Palmeiras é outro que está à procura de um gringo que venha com a missão de fazer com que o time volte a encantar o seu torcedor. O espanhol Miguel Angel Ramírez chegou a acertar bases salariais e ficou muito perto de ser anunciado, mas recuou e preferiu ficar no Independiente del Valle. Um treinador de fora, no entanto, segue no radar do clube, que tenta seguir uma tendência global de apostar em profissionais do exterior. Quique Setién, ex-Barcelona, e o argentino Gabriel Heinze são cogitados.

"Existe um movimento natural de abertura de mercado. Hoje os clubes brasileiros procuram jogadores e também técnicos de fora, principalmente no mercado sul-americano. Os jogadores vêm e, consequentemente, os treinadores viriam também", diz ao Estadão Rodrigo Caetano, diretor de futebol do Inter, que apostou em Coudet no começo do ano.

"É uma tendência global esse movimento. Essa ideia de trazer novas culturas para uma liga é um fenômeno mundial. Ele talvez se solidifique mais porque esses profissionais não estão contaminados por esse problema nosso de pressão por resultados imediatos", avalia Rui Costa, executivo de futebol com passagens por Grêmio, Chapecoense, Athletico e Atlético-MG.

Como vêm de fora, os comandantes "importados" muitas vezes não conhecem alguns jogadores brasileiros e isso pode ser positivo para eles. "Acho que o que contribui também é que o técnico estrangeiro não tem nenhum vínculo com os jogadores. Ele vem totalmente isento em fazer suas escolhas e opções. Muitas vezes, um brasileiro considera mais um jogador por conhecê-lo. E o técnico de fora vai analisar o momento e não o histórico", opina Rodrigo Caetano.

No time mineiro, Rui Costa trouxe no começo deste ano o venezuelano Rafael Dudamel, que, no entanto, teve pouco tempo para mostrar serviço e foi demitido após dez jogos. O dirigente também foi dispensado naquela ocasião. Essa pressa em obter resultados, na visão do executivo de futebol, é justamente um dos problemas que atrapalha os treinadores, estrangeiros ou brasileiros.

"Não há como fazer um trabalho de estruturação de mudança se não for dado esse tempo para o técnico. A grande adaptação que tem que ser feita é anterior à assinatura do contrato. Aquele profissional escolhido, especialmente o estrangeiro, vai precisar de um tempo de adaptação", analisa Rui Costa. Ele cita os exemplos do argentino Marcelo Bielsa e do alemão Jürgen Klopp, técnico de Leeds United e Liverpool, respectivamente, para endossar sua opinião. Os dois fracassaram em suas primeiras temporadas e só conseguiram seus objetivos posteriormente. Quando chegou, Klopp, inclusive, ressaltou que os títulos só viriam depois de pelo menos três anos. E foi o que aconteceu com o seu Liverpool, que foi campeão europeu, nacional e mundial.

Além de não dar tempo aos seus treinadores, alguns clubes têm falhado em não definir um perfil de profissional que buscam para adotar o conceito de jogo que desejam. Falta, muitas vezes, coerência para os dirigentes.

"Posso dizer com absoluta convicção que, mais importante do que chegar ao nome de um técnico estrangeiro, com montagem de comissão técnica e tudo mais, é o que antecede isso. É nesse processo que estamos pecando. É preciso definir um perfil antes de buscar um comandante. Tem de saber se você quer um técnico que potencializa os jovens jogadores e com ele você vai chegar a títulos daqui a duas três anos, ou se quer um retorno imediato com um técnico que vai chegar e pedir um investimento grande em contratações", salienta Rui Costa.

Essa "dança das cadeiras" acaba prejudicando a qualidade do futebol brasileiro e também afeta a visão dos que vêm de fora têm daqui. "A gente está boicotando o nosso produto. Estamos muito distantes do que se faz em outros locais porque os treinadores não podem ousam para manter o emprego. Isso está depreciando o nosso futebol", acrescenta o dirigente.

BRASILEIROS - Não são só os comandantes estrangeiros que têm se destacado. Dois brasileiros, em especial, tiveram tempo e respaldo para colocar suas ideias em prática e os resultados apareceram. São eles Rogério Ceni, no Fortaleza, e Renato Gaúcho, no Grêmio. Ambos são exceções dentro da realidade atual no futebol brasileiro, em que as trocas são constantes e os trabalhos são cada vez mais curtos.

"Acho essa troca de experiência boa, mas eu não tenho dúvidas de que os treinadores brasileiros estão na lista dos melhores do mundo. Não fomos penta só por causa dos jogadores. Todos aqueles jogadores foram trabalhados muito bem", observa o presidente da Federação Brasileira dos Treinadores de Futebol (FBTF), José Mario Barros.

Umas das exceções dentro dessa realidade, Rogério Ceni teve tranquilidade para poder executar seus conceitos e os resultados não poderiam ser melhores. Em campo, chamam a atenção a disciplina tática, organização e a sincronia dos movimentos dos seus atletas. Em quase três anos no Fortaleza - no meio do caminho ele teve uma passagem frustrante pelo Cruzeiro - o treinador conquistou quatro títulos. Ganhou a Série B do Brasileiro, a Copa do Nordeste e foi bicampeão cearense, entrando para a história do clube. Ele tem contrato até o fim do Brasileiro, em fevereiro de 2021, e pretende cumpri-lo.

"Tenho as minhas convicções, trabalho dentro delas, e tento me ajustar, estudar o que há de mais moderno no futebol mundial. Pesquiso muito sobre bolas paradas, converso com pessoas de fora, com treinadores italianos, dinamarqueses, franceses. Não sou modelo de treinador, mas gosto do trabalho faço e tenho convicção naquilo que realizado dentro do campo", explicou Ceni.

Embora o Grêmio tenha oscilado nesta temporada, o trabalho de Renato Gaúcho também é muito positivo. Identificado com a torcida e a história do clube, ele completou quatro anos no cargo. É o técnico mais longevo do futebol nacional e caso raro diante da alta rotatividade por aqui.

Desde que assumiu a equipe da qual é considerado ídolo, em setembro de 2016, Renato Gaúcho empilha taças. Foi campeão da Copa do Brasil daquele ano, da Copa Libertadores de 2017, da Recopa Sul-Americana de 2018 e tricampeão gaúcho (2018, 2019 e 2020). O treinador sempre reforça que seus comandados jogam um futebol vistoso e não costuma fugir das polêmicas.

"Não tem segredo. É trabalho. É confiança no meu grupo. O Grêmio está ganhando tudo há quatro anos e não presta quando não vence três ou quatro jogos? E a gente gosta quando vem essas críticas do coração", afirmou, em entrevista após a vitória no último Gre-Nal.

Fonte: Estadão Conteúdo
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