00:10hs
Sexta Feira, 19 de Abril de 2024

Leia nossas últimas edições

Leia agora o Correio do Papagaio - Edição 1845
Opinião
28/12/2012 10h15

AIRES JOCA, O MUDO DE SÃO JOÃO

Joca, o mudo de São João

Um personagem que podemos tê-lo incluso às histórias das ferrovias, que segundo meu pai Luiz, notabilizou-se por um episódio à década de 30, o qual veio a tonar-se símbolo na cidade de São João Nepomuceno, MG, pelo desaparecimento estranho da estação férrea de forma misteriosa, onde muito conhecido tinha ali, há vários anos seu “negócio” na venda de rapaduras com aquiescência do chefe da estação, por tratar-se de um deficiente auditivo.

Baseado neste ocorrido que na ocasião mexeu com a sensibilidade local, resolvemos transcrevê-lo.


Meu pai Luiz, sempre que fazia sua praça comercial, assim que galgava a plataforma de São João, seu primeiro contato era com Joca, o mudinho, a encomendar suas rapaduras, as quais levaria quando ao retorno ao Rio de Janeiro. Numa oportunidade ao deixar o expresso e caminhar à direção das cestas de Joca visando em adquirir as rapaduras, no que se chegou, notou a ausência do mudinho.

Sem poder aguardá-lo foi à procura do chefe da estação e soube que o mesmo até àquela hora não havia aparecido, embora suas cestas ali estivessem.

Luiz então deixou com o chefe a encomenda, pois retornaria dois dias depois no regresso ao seu destino. Três dias se passaram e Luiz ao chegar à estação, abordado pelo chefe, tomou conhecimento que o mudinho continuava desaparecido causando grande preocupação a todos, no que pesassem as medidas tomadas como:
comunicação ao destacamento policial, expedições inúmeras de textos pelo telégrafo da estação às cidades circunvizinhas, formações de mutirões de buscas, enfim fez-se o possível para tentar encontrá-lo, mas até o presente não se conseguiu um paradeiro ou pista.


Um mês se passou e Luiz de volta a São João. Ao pisar à estação, observava que Joca não se encontrava. Temendo o pior, foi ao chefe da estação que o tranqüilizou ao informar do aparecimento do pobre mudinho depois de “confinado” por quase quatro dias num vagão de carga em São João Del Rey, após ser salvo casualmente por alguém que passou, por acaso, à linha aonde o vagão

estacionara. Escutando um som sussurrante, o cidadão intrigou-se atribuindo ser de gemidos humanos e resolveu abrir a porta, cuja tranca passada à base a trancava externamente. Assustou- se ao ver deitado ao chão aquele homem todo ensangüentado em estado de total letargia. Correndo à estação, comunicou o fato para logo em seguida ser conduzido pela polícia a Santa Casa onde foi socorrido permanecendo internado.


Com a sua recuperação num crescente, já com os ferimentos, principalmente as mãos e pés cicatrizando-se, uma coisa, porém, deixava os médicos preocupados, ou seja; seu estado de debilidade mental, pois passava o tempo todo alheio a tudo na sua volta, como estivesse desligado do mundo. Obviamente por ser surdo e mudo, coisa não detectada pelos profissionais que dele cuidavam. Além deste detalhe, era semi-analfabeto e a comunicação pela escrita não ajudava.


Portanto, seu diagnóstico foi dado como amnésia temporária já que possuía um hematoma à cabeça, e a causa tudo leva a crer. Mas por sorte, novamente por acaso, uma pessoa que ali no hospital fora visitar um parente, ao saber do caso do Joca em conversa, como funcionário da ferrovia, aliou o caso ao desaparecimento do mudinho e foi comunicar a direção, o que acabou confirmado com a presença do chefe da estação de São João Nepomuceno.


A seu modo, pela deficiência, Joca contou que àquela noite que sumiu, depois de arrumar suas rapaduras, como o frio era intenso, foi se abrigar num dos vagões vazios de carga. Ao fechar a porta não atinou à posição da tranca externa que se deslocou com o bater forte da mesma e deu no que deu, só vindo a perceber que estava trancada já com o trem em movimento pelo sacolejar.


Assustado, na escuridão, tentou em vão deslocar a pesada porta com o auxilio da força e apenas conseguiu alguns ferimentos às mãos e braços. Cansado pelo esforço, rendeu-se ao infortúnio, à espera de quando a composição parasse, o que mesmo ocorrendo algumas vezes não foi ouvido; no que pesem os socos e chutes à porta a levá-lo ao estresse e ao desespero além da exaustão pelas forças que, consideráveis, eram exauridas à medida que os dias iam passando. Com sede, fome, calor e muito debilitado, jogou-se ao chão entregando-se a Deus até ser encontrado.

Chegou à cidade após 25 dias de ausência, numa recepção calorosa a fazer inveja a muita gente importante na época e, para sua alegria, o dinheiro pela venda de suas rapaduras deixadas quando sumiu, efetuada pelo chefe da estação.

PUBLICIDADES
SIGA-NOS
CONTATO
Telefone: (35) 99965-4038
E-mail: comercial@correiodopapagaio.com.br