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Opinião
30/12/2014 16h54

Conhecer somente a história não nos basta!

Odilon de Mattos Filho

Por Odilon de

Mattos Filho*

 

Somos sabedores da catástrofe que foi o período de 25 anos de ditadura militar no Brasil. No entanto, pouco se sabia sobre as atrocidades cometidas pelo Estado, por meio de seus agentes e dos Presidentes Militares contra aqueles que lutavam pelo fim do regime de exceção.

Ao contrário de vários países da América do Sul que já passaram a limpo suas histórias sobre as ditaduras, a nossa só começou a ser contatada a partir de 2011, com a sanção da Lei 12.528/2011, que cria a “Comissão Nacional da Verdade (CNV)” com a finalidade de apurar graves violações de Direitos Humanos ocorridas entre os anos de 1946 a 1988.

A CNV encerrou seus trabalhos e entregou à sociedade um extenso Relatório com 4.400 páginas e 1.120 depoimentos. O Relatório final aponta para 434 vítimas do regime, 191 mortes, 210 desaparecidos sendo que 33 foram localizados. A CNV identificou, ainda, 6.591 militares presos, torturados ou processados pela ditadura militar (1964-1985).

Esse relatório descreve, também, 20 técnicas de tortura física utilizadas para reprimir os opositores do regime militar, como por exemplo, o choque elétrico, corredor polonês, cadeira do dragão, o uso de animais, dentre outros cruéis meios de tortura.

Por fim a CNV responsabiliza 377 militares pelos crimes cometidos durante a ditadura, incluindo todos os ex-presidentes da República, Ministros de Estado e chefes de setores de inteligência das Forças Armadas.

Em solenidade ocorrida no Palácio do Planalto no dia 10/12/2014, data que se comemora o Dia Internacional dos Direitos Humanos, a Presidenta Dilma Rousseff, uma das vítimas das barbáries da ditadura militar, recebeu da CNV o Relatório Final dos trabalhos. Em discurso carregado de muita emoção a Presidenta disse:”...Nós que acreditamos na verdade esperamos que esse relatório contribua para que fantasmas de um passado doloroso e triste não possam mais se proteger nas sombras do silêncio e da omissão... Quem da voz à história são os homens e mulheres livres que não tem medo de escrevê-la...O Brasil certamente saberá reconhecer a importância desse trabalho que torna nossa democracia ainda mais forte.”

Malgrado o detalhado Relatório da CNV que, diga-se de passagem, é o documento mais importante desse sombrio período de nossa história, não temos dúvidas da imperiosa necessidade de que os culpados sejam, devidamente, julgados e punidos nos termos da lei. Não é aceitável que a Lei de Anistia se transforme em amnésia, ademais, está claro no relatório da CNV que esses delitos configuram crimes contra a humanidade, e como tal são imprescritíveis, sob a luz dos tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário.

A propósito, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos prevê que “leis de autoanistia constituem ilícito internacional; perpetuam a impunidade e propiciam uma injustiça continuada, impedindo às vítimas e a seus familiares o acesso à justiça, em direta afronta ao dever do Estado de investigar, processar, julgar e reparar graves violações de direitos humanos”.

Dessa maneira cabe ao Congresso Nacional revogar parte da Lei de Anistia para que se possa julgar e condenar os envolvidos nesses crimes. Em outra ponta, cabe à Presidenta Dilma ordenar as Forças Armadas a pedirem desculpas ao povo brasileiro e às famílias das vítimas trucidadas pelo aparelho do Estado.  Essa atitude, longe de ser uma humilhação às Forças Armadas, é um imperativo para uma verdadeira reconciliação com o povo brasileiro e um claro sinal do compromisso dos militares com a democracia e com a formação das novas “gerações de servidores fardados”.

Por fim, e com objetivo único de registar para as atuais e futuras gerações o grau de crueldade que se chegou com as torturas, transcrevemos parte do chocante depoimento do líder Camponês, Manoel da Conceição, que narrou à Comissão da Verdade as torturas que sofreu no Quartel da Polícia do Exército, no Rio de Janeiro. Disse Manoel: “...além do choque elétrico, do pau de arara e do espancamento, levantaram meus braços com cordas amarradas ao teto, colocaram meu pênis e os testículos em cima da mesa e com uma sovela fina de agulhas de costurar pano deram mais de trinta furadas. Depois bateram um prego no meu pênis e o deixaram durante horas pregado na mesa...”. Ditadura nunca mais!

 

Odilon de Mattos Filho, odilondemattos@gmail.com,  Andrelândia/MG

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