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Opinião
27/03/2014 11h26

O doce café amargo

José Luiz Ayres

Por José Luiz Ayres

Ondino, um amigo de meu pai Luiz desde a época em que ambos eram remadores pelo Clube de Regatas São Cristovão, do Rio de Janeiro, com o falecimento do pai (na ocasião um industrial de uma torrefação de café – Café Camões Ltda – entre as poucas existentes, inclusive a subsidiar o clube) se viu, pelas circunstâncias, obrigado a assumir os negócios, passando a ser responsável pelo sustento da família. Desligando-se do clube, evidente, afastou-se dos amigos.

Tempos depois, Luiz, já como representante da fábrica de tecidos Bangu, operando como caixeiro viajante pelo sul de Minas encontra-se com Ondino, que, após trocas de recordações clubísticas, um tanto desanimado confessa que a torrefação vai de mal a pior. Como calouro no mercado, sem a vivência tão necessária no ramo, por se estar sempre subjugado às especulações das cotações, onde os “atravessadores”, digo corretores, manipulam os preços, e não ter mais um capital de giro para manter estoques, praticamente estava perdendo a batalha, a caminho de uma falência iminente.

Meu pai, penalizado e sentido pela confissão dramática do amigo, e dados os seus conhecimentos comerciais no sul mineiro, tentando ajudá-lo, propõe apresentá-lo a alguns produtores fazendeiros de café, a livrar-se das famigeradas corretoras. Sem pestanejar, se dispôs a aceitar o oferecimento, e lá foi Ondino embarcado no trem rumo à sua salvação, ao lado de Luiz, o velho amigo de remadas.

Apresentações feitas, conhecimentos concretizados, amizades crescentes, negócios em próspero desenvolvimento, Ondino, a recuperar o bom nome da torrefação, com quase um ano de estabilidade econômica, resolveu ampliar seu negócio, na linha da exportação, pois, dada a qualidade do seu café, obteve vários contratos, inclusive o de abastecer duas grandes frotas de transatlânticos: a Portuguesa e a Italiana. Porém, em agradecimento a meu pai, propôs a ele parte da sociedade, no que o amigo aceitou. Nascia então a SulmineiraCoffe Ltd.

Nessas andanças ferroviárias, Ondino, ainda imaturo no que se relacionava ao transporte de cargas pelas ferrovias, contou a Luiz que, numa ocasião, se viu envolvido num episódio no qual teve seu “batismo” como viajante. À cidade de Campanha (MG), Ondino aguardava a chegada de três vagões procedentes de Guaxupé (MG). Este café in natura seria selecionado e qualificado na empresa beneficiadora junto à estação campanhense, onde a SulmineiraCoffe centralizava suas operações de seleção, a posteriormente remetê-lo ao Rio de Janeiro. Só que este carregamento não chegou, e Ondino, desesperado pela demora, resolveu saber o motivo junto às ferrovias responsáveis, e nada soube da tal carga com destino a Campanha. Injuriado e enfurecido, afinal aquele café já estava comprometido à Alínea “C”, disparou a intimidar e prometer processar os responsáveis pela negligência efetuada, e exigir uma polpuda indenização por danos comerciais e morais em ter o nome da SulmineiraCoffe enxovalhado no meio exportador. Até que Luiz descobriu o motivo: Ondino passou ao produtor que as sacas seriam destinadas à Alínea “C”, Itália, esquecendo-se de remetê-las à beneficiadora em Campanha para seleção e classificação. Como o manifesto da carga passou a ter o encaminhamento à Itália, foi despachada a Jundiaí (SP), no intuito de chegar ao porto de Santos (SP) visando à exportação, ainda mais em se tratando de sacas de café.

Sabedor da asneira cometida, Ondino se penitenciou, e teve como castigo amargar 20 dias de espera pelos entraves burocráticos para trazer o café a Campanha e arcar com expressiva conta a pagar pelo fretamento dos vagões, além do transporte nas ocupações das linhas ferroviárias utilizadas, para ida e volta, tornando  amargo o doce café...

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