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Opinião
09/05/2012 20h13

Opinião Memórias de um Etíope: O Colégio Interno (I)

Memórias de um Etíope: O Colégio Interno (I)

O coração de Jesus seguramente deve ter vivido uma nova paixão, ao assistir a tantos acontecimentos tristes. Também, sabedor de quantos traumas causou-me o colégio que fica localizado em Varginha. 

 

Somente quem passou por uma experiência desta é que pode dizer o quanto é amargo e doloroso.  

 

Não discuto a qualidade do ensino que recebi, nem imputo a culpa aos meus pais. Eu é que pedi para ir estudar naquele internato. 

 

Em 1958, quando meu pai me levou para lá eu não sabia o que me esperava. 

 

Estava mesmo muito animado, ao começar uma nova experiência de vida. Era um tempo de comunicações difíceis. Não havia a facilidade de telefonar como hoje em dia. Notícias, em geral, eram por cartas. 

 

Passei a tarde passeando com meu pai e, à noite, ele foi me levar ao colégio. Foi com lágrimas nos olhos que aquele menino de 11 anos despediu-se do pai, ao pé da escada para o dormitório. Eu fui o último aluno da fila dos que iam, comandados pelo irmão regente, recolher-se. Era o dia 1º  de março.

 

Durante muitas e muitas noites, naquele princípio, dormi chorando e não parava de pensar em São Lourenço e na minha família, especialmente em minha mãe.  

 

Se falava ao telefone, para tentar amenizar a dor da ausência, às vezes, tinha a voz embargada pelo pranto. Parecia-me estar numa cadeia. 

 

A maioria dos irmãos não tinha nenhum preparo psicológico para lidar com os alunos. A psicologia não tinha tanto valor como nos dias atuais. Era imposta a lei da ditadura. Havia muitos que eram uns frustrados. Em momentos de nervosismo, lançavam todas as farpas em cima das pobres crianças, que não tinham culpa de nada. Havia, no entanto, entre eles, honrosas exceções. 

 

Quando levavam os alunos para nadar, por exemplo, em vez de estimularem os que ainda não haviam praticado este esporte, simplesmente se calavam. Nunca aprendi a nadar.  

 

Diversos deles eram injustos, tinham preferências marcantes por um ou outro aluno. Não tinham capacidade alguma de julgar e educar ninguém e estavam lá, propondo-se a isto. 

 

Éramos obrigados a tomar banho frio, mesmo no inverno. Não havia água quente. E sabemos todos que os invernos de cincoenta anos atrás eram muito mais rigorosos.

 

As privadas eram daquelas antigas, que tínhamos que usar agachados, além de serem imundas.

 

Assim, pedi para deixar aquela escola no segundo semestre de 1958 e passei dois anos estudando em São Lourenço. O segundo semestre foi feito no antigo Externato São Francisco, na Praça da Matriz. Em 1959 fui estudar no velho e querido Ginásio São Lourenço, na Estação. 

 

No segundo semestre de 1960, resolvi tentar outra vez, a experiência de estudar interno. Lá fui eu,  levando para ler no trem, várias revistas esportivas, num dos primeiros dias de agosto. Meu pai foi levar-me de novo. Cheguei chorando, como dois anos antes. Quando vi aquele lugar, pensei: − Não é possível, deve ser um grande pesadelo, estou de volta à prisão? Terei cometido mais algum crime? 

 

Era tudo mais ou menos o mesmo esquema, principalmente na parte de preferências, em que escolhiam as pessoas ricas e importantes do Rio de Janeiro, para deixar fazerem o que bem quisessem.  (continua)

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