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Opinião
03/12/2015 16h48

Trem o testemunho de fé

José Luiz Ayres

Recordando  mais uma vez das histórias narradas pelo saudoso amigo monsenhor Barbosa, durante a época que sua pastorização baseava-se à região de Valença, em que entre as atividades religiosos além de pároco de Rio das Flores, RJ, estendia-se a toda as localidades por aquela rurícola região, cuja assistência pastoral e na oficiação dos ritos sacramentais tinham sua presença permanente. Lembrando-me de um episódio o qual o trem foi o ponto vital, pois teve tudo a ver com suas necessidades prementes no que concerne ao seu, na ocasião, passadio dado à ocorrência na aquisição dos alimentos no seu sustento.

Após oficiar dois batizados numa fazenda aos arredores de Rio Preto, MG, cujo latifúndio alongava-se ao município de Parapeuna, RJ, já à estação fluminense, aguardando à chegada do expresso das 12 horas sob forte calor, com a  presença da composição férrea que adentrava à estação quase no horário e, auxiliado pelo capataz que o trouxera na charrete e, ali permanecia no intuito de ajudá-lo a transportar os presentes que lhes foram ofertados pelo fazendeiro, acomodando-se à poltrona e tendo suas sacas contendo os oferecimentos colocados no bagageiro superior, agradeceu ao homem pelo auxilio e lá foi o expresso no seu natural sacolejar trilhos afora. Um tanto receoso quanto a acomodação da sua “valiosa carga”, assim que o agente; seu João, acessou o vagão, o chamou e solicitou da possibilidade em ajudá-lo tão logo chegassem a Rio das Flores em retirar e conduzir uma das sacas à plataforma, já que eram um pouco pesadas e que o faria levá-las uma a uma, causando retardo ao comboio. Seu João, prontamente se prontificou a auxiliá-lo, inclusive propôs a sugestão em retirá-las do bagageiro e colocá-las junto à porta de acesso a varanda visando facilitar no desembarque. No que foi aceito por Barbosa de imediato.

Procedida a operação, Barbosa, brincando o a visou a ter cuidado, pois ali estavam “preciosas cargas”: 3 queijos minas frescos, 2kg de manteigas, 4 l de leite, 3 requeijões e linguiças. Na outra saca, continham: laranja, mamão, mexerica, bananas, 2 Kg de fubá, café, doces de goiaba e figo e rapadura. Portanto, todo cuidado é pouco, e “essas rações”, são o complemento à toda semana!

Acomodado à poltrona, mantendo o olhar as belas e tocantes paisagens descortinadas pela janela e obviamente cônscio do dever cumprido por ter tornado dois pagãos em cristãos e, entre constantes piscadelas de olhos, deixou-se levar pela sonolência se entregando aos braços de Morfeu (Deus do sono). De súbito, abriu os olhos e se deparou com seu amigo agente João, que se mostrando constrangido, tenta falar a Barbosa; que ainda sonolento, fora de sintonia arregalou os olhos franzindo a testa, a perguntar o que o levara a procurá-lo. João meio desarticulado, conta o que ocorrera com as suas “sacas preciosas”, dizendo que lamentavelmente aquela contendo os laticínios, com o provável balanço do trem, deslocou-se de cima das de fruta e doces e foi ao chão. Dado ao impacto, ouve quebra de garrafa de leite, com o visto alagamento apreciável pelo vagão. Diante da triste notícia, Barbosa elevou-se do assento indo “in loco” verificar o grave problema. De fato o estrago fora considerável. Com cuidado, abrindo a saca verificou que das 4 garrafas, apenas 1 mantinha-se intacta. Porém a maior surpresa foi observar que dos 3 queijos, 2 deles estavam repletos de cacos e caquinhos de vidro, assim como os 2Kg de manteigas, que devido ao esmagamento  e o amolecimento pelo calor, diluíam-se ao leite esparramado.

Com ar de tristeza, retornou à poltrona e pôs-se a pensar, não a se lamentar. Mas agradecendo a Deus por ser circundado de pessoas amigas, humildes, leais e sinceras, pois sem elas não saberia como viver nesta evangelização diuturna a qual tem o orgulho e o prazer de evangelizar. Lamentou e pediu pelo amigo irmão João, cujo envolvimento no incidente ocorreu por pura obra do acaso. Ao chegarem a Rio das Flores, teve o pronto atendimento nas bagagens conduzidas a plataforma pelo agente João, que mais uma vez, ainda bem triste e amuado, pediu mil desculpas por ser um desastrado, juntamente com também amigo Júlio; o chefe do trem.

Após à celebração da missa dominical das 7 horas, ao recolher-se à sacristia foi surpreendido ao ver sobre a mesa uma saca e uma leiteira de alumínio a conter 5 l de leite. Ao abrir a saca, lá estavam: 2 queijos minas, um embrulho com manteiga, um pote com requeijão e duas broas de milho, e ao lado da saca, sobre a mesa, um cartão onde se lia: “Nosso abraço e que possa se deliciar. Com nossos agradecimentos que faz em favor de nós; os interioranos. Dos amigos e irmãos Júlio e João”.

Sorrindo, limitando-se a olhar a imagem de Cristo, externou: “- Tu Senhor, sabes como aqueles alimentos seriam importantes, pois nossas provisões sob racionamento são escassas a nos limitar com um pouco de feijão e arroz, já que o conserto do madeirame do telhado da matriz comido pelo cupim, nos obrigou a sangrar as reservas da matriz a evitarmos uma grande tragédia. Mas como tu és o nosso pastor, nada nos faltará.”

 

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