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Opinião
12/08/2016 09h23

Tropeço do destino, traz a luz um herói

Por José Luiz Ayres

Em meio aquela agradável manhã, depois de desfrutarmos da extensa e saudável caminhada pelo Parque das Águas em Caxambu, MG, já de retorno pela alameda do canal sob as deliciosas sombras das exóticas e tortuosas árvores margeantes, optamos por descansar num dos bancos ali posicionados e, relaxados, ficamos a curtir a bela paisagem que a natureza bem preservada nos oferecia.
Entre as curiosidades, onde plantas decorativas, gramado tratado, insetos diferentes e imensa variedade de pássaros que nos atraiam a atenção a nos deixar absortos e desligados do cotidiano, no que desviei o olhar a observar um casal de João de Barro que nos parecia executar sua tarefa de construir um ninho; tal a frequência em voar ao chão, a buscar na argila umedecida seu componente à construção, quando notei caminhando pela alameda duas senhoras de braços dados. Atento ao João de Barro, mantive o olhar no alto da árvore a apreciar uma dádiva que nos era presenteada pela natureza. De súbito, escuto um grito e vejo uma das senhoras; que me pareceu tropeçar, sendo projetada ao chão, justamente no cruzamento da alameda com a ex-via que fora usada pelo trem, quando os vagões de cargas eram deixados no intuito do carregamento das garrafas de água mineral. Erguendo-me do banco, acorri em seu socorro elevando-a do chão. Se lamentando que não observara os trilhos que ali ainda permanecem e que os fizeram a ir por terra, esfregando os joelhos e mãos, com ajuda da amiga a conduzimos ao banco onde sentou-se. Continuamente a esfregar um dos joelhos que se apresentava esfolado, assim como uma das mãos, procurou se manter tranquila a dizer gracejos a fim de amenizar a tensão pelo ocorrido. Refeita do susto, com as ardências dos ferimentos sendo assimilados no bom humor que passava a externar pelo sorriso já exposto, a gracejar o momento fortuito acontecido, lembrando-se a dizer que por sorte não havia mais trem no local e, recordando, pôs-se a falar de um episódio ocorrido à sua infância na saudosa cidade de Barra do Pirai, RJ, onde seu tio Eunápio tornou-se herói ao salvar uma garotinha que inocentemente aguardava à passagem de nível o trem a cruzá-la.
De acordo com o relato de D. Salete; como se disse chamar, que à época tinha por volta de 9 anos de idade, teve o conhecimento do fato pela repercussão que se propagou na cidade a tornar o seu tio um grande herói. O motivo deveu-se à coragem e a bravura com que agiu diante da dramática situação, onde se viu “obrigado” a executar um salvamento em que o risco de insucesso fazia-se iminente tal a magnitude do percentual em obter o êxito esperado a contar talvez pela fração de segundos entre a vida e a morte.
Aguardando à passagem de um trem perante a cancela fechada a sinalizar a interrupção do trânsito de pedestres, de súbito vê sendo lançada aos trilhos, uma pequena boneca, que permaneceu sobre um dos trilhos. Procurando verificar quem a jogou, virando-se a olhar as pessoas, ao voltar-se à frente, vê uma garotinha passar sob o travessão da cancela indo à direção da boneca; no exato momento que o apito da locomotiva soa avisando da sua passagem. Eunápio, apavorado, olha e vê que o trem estava a menor de 15 m de cruzar. Sem medir o risco, ultrapassa o travessão e num salto jogou-se sobre a criança no instante que a composição férrea cruza a cancela lançando vapor sobre os transeuntes que ali em total pavor e desespero, passam a gritar pelo trágico acidente sob tensão e agonia à espera do comboio concluir à passagem.
Com o último vagão a passar, quando se esperava por uma cena macabra de horror, a visualizar a via férrea, observa-se caídos à margem oposta do leito a poucos centímetros do trilho, que os corpos por total milagre, permaneciam inertes, mas vivos. Já com a presença de todos que a eles acorreram, Eunápio queixando-se de fortes dores à perna esquerda, passa às mãos de uma senhora a criança, que talvez assustada pelo abrupto e salvador impacto a ser salva, mantem-se a chorar e pedir a sua boneca.
A menina graças a Deus nada sofreu, a não ser o susto e a perda da boneca estraçalhada pelas rodas do trem. Quanto ao tio Eunápio, teve a perna fraturada ao seu atingido de raspão pela locomotiva, o que valeram três meses de gesso e de imobilidade na sua função de agente ferroviário e uma medalha de honra ao mérito pelo heroísmo praticado; ofertada pela direção da Ferrovia Central do Brasil, onde trabalhava até se aposentar. Com a pequena sequela a puxar da perna esquerda, teve o seu, ai sim, desenlace aos 87 anos de idade. Portanto, após um tropeço, onde o trilho foi o causador, D. Salete nos presenteou com sua bela história de heroísmo, trazendo a luz seu saudoso tio Eunápio, que como tantos outros heróis foram esquecidos pelo apagar dos anos.

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