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Opinião
26/09/2013 14h40

Xavier e sua promessa

José Luiz Ayres

por José Luiz Ayres


Seu Leônidas, um senhor que tive o prazer em conhecê-lo durante uma visitação que efetuávamos pelos pampas gaucho; por coincidência também natural do Rio de Janeiro, se disse um ferroviário, pois exerceu suas atividades por 40 anos na extinta ferrovia Central do Brasil. Entre as prosas trocadas, óbvio, o trem foi a tônica, com recordações de passagens e episódios vividos ao longo da vida, onde por 25 anos atuou como chefe de estações pelo interior fluminense.

Nestes seus nostálgicos devaneios, talvez incentivado pelas belas e bucólicas paisagens, seu Leônidas empolgado narrava com certa emoção seus momentos de recordações como um monólogo, a fluir de sua mente cada vez mais incontroláveis. De súbito, lembrando-se que estávamos às proximidade do dia dos santos Cosme e Damião, fez questão de contar um fato o qual marcou sobremaneira pelo resto de sua vida.

Dizia que quando jovem, funcionou em Barra do Pirai, onde conheceu um colega aposentado que operou por vários anos no ramal de Valença como agente nos trens. Um dia, exatamente destinado aos Santos Cosme e Damião (27 de setembro) ao auxiliar o maquinista da locomotiva na operação de montagem do comboio das 5:45h, no pátio de manobras de Barra, por descuido, teve parte da mão esquerda prensada entre os engates dos vagões. Desesperado, preso a composição que passou a se deslocar e sentindo que seria morto pelas rodas, já que em movimento o comboio aumentava de velocidade e um tropeço sobre o pedregal do leito seria inevitável, apavorado tentou agarrar-se a escada clamando aos santos – segundo a história os têm como médicos – a fim de protegê-lo.

Com muito esforço e altíssima fé, tendo a mão direita livre, após um impulso milagroso alcançou o balaustro, onde com o braço estendido ao limite, pois o esquerdo mantinha-se peso pela mão prensada ao engate sob dores dilacerantes, permaneceu a clamar a Cosme e Damião pela sua vida. Finalmente a composição ao parar à plataforma, seu Xavier, o desafortunado ferroviário, é retirado e socorrido por pessoas que ali se encontravam sendo encaminhado às presas ao hospital local.

“O conhecimento com Xavier e bem como do trágico acidente, deveu-se quando fui procurado à minha sala na estação, a me solicitar permissão em viajar à cabine da locomotiva, já que há 5 anos vem pagando sua promessa em oferecer ao longo da viagem saquinhos de doces às crianças, em cumprimento aos Santos milagrosos por haver intercedido por ele quando na sua aflição e agonia perante a morte. Ao ouvi seu terrível relato e ver sua fervorosa missão, não pude deixar de autorizá-lo no seu objetivo, mesmo sabendo que o comboio teria um atraso proveniente das várias paradas a serem efetuadas ao longo do percurso.

Segundo revelou-me, sua promessa consistia na distribuição de 500 saquinhos repletos de guloseimas, que eram conseguidas, além dos 100 sacos seus por obrigação, mais uma totalidade adquirida através das contribuições espontâneas de colegas ferroviários, amigos, comerciantes de barra do Pirai e de outras localidades. O primeiro ano foram 100 sacos, mas a cada ano ia aumentando e este quinto ano serão 500.

Deixando a sala, feliz, lá foi Xavier em direção a Maria-Fumaça levando com o auxílio de um agente, os sacos contendo seus saquinhos de Cosme e Damião. À porta da sala, fiquei a observá-lo caminhando e pensei comigo mesmo, como deveria ter sido seu momento de horror pelo que passou, naqueles segundos, onde sofrendo pela dor dilacerante de ter a mão esmagada e a tensão e o pavor em ver a morte se aproximando ao olhar o chão, notando as rodas como guilhotinas impiedosas. A fé certamente o salvou dada a intercessão dos Santos Cosme e Damião!”.

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