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12/12/2014 11h10

Filmes enriquecem com vigor e criatividade evento de direitos humanos

Dois filmes que já tiveram apresentações especiais no recente evento Cinema da Quebrada terão pré-estreias gratuitas neste final de semana, no quadro do Festival de Direitos Humanos. Ambos também integraram a Mostra Aurora, em Tiradentes, no começo do ano, no qual A Vizinhança do Tigre, de Affonso Uchoa, foi o grande vitorioso. Em setembro, foi a vez de Branco Sai Preto Fica, de Adirley Queirós, vencer o Festival de Brasília. Branco Sai será exibido nesta sexta-feira, 12, às 20 horas, ao ar livre, no Parque do Ibirapuera, integrando a programação Cidadania nas Ruas, do Festival de Direitos Humanos. No sábado, 13, às 11h45, A Vizinhança passa no Espaço Itaú Frei Caneca, seguido de debate com o diretor.

Será interessante assistir a A Vizinhança do Tigre olhando para os lados e podendo ver, talvez, skatistas não de todo diferentes dos que estão na tela, mesmo que o público que curte o Ibirapuera não seja exatamente o mesmo das quebradas de Contagem, no interior de Minas. No filme de Affonso Uchoa, os garotos falam entre si, e para a câmera, na linguagem ritmada do rap. Dividem-se entre o trabalho e a diversão, a esperança e o crime. Cada um segue sua história, mas, no final, todos deslizam unidos em seus skates, enquanto na trilha cresce repetido o verso 'Eu queria mudar/eu queria mudar...'.

Na Semana dos Realizadores, no Rio, Uchoa falou do longo processo que foi fazer seu filme. Foram anos. Confessou que, num determinado momento, estava tão envolvido com seus personagens que precisou de um olhar 'estrangeiro' - um montador que até então não participara do processo - para conseguir finalizar a obra. O comprometimento dá a tônica de A Vizinhança do Tigre. Os protagonistas são atores deles mesmos. Artistides de Souza, Eldo Rodrigues, Adilson Cordeiro, Maurício Chagas e Wederson Patrício. A 'vizinhança' é a quebrada, o tigre é a energia que esses jovens precisam domar dentro deles. Querendo morder o mundo, devorá-lo, muitos jovens são devorados por ele.

Affonso Uchoa é mineiro, Adirley Queirós é brasiliense, de Ceilândia, na periferia da Capital Federal. A quebrada do diretor tem sido o cenário de seus filmes. Ele não apenas dá voz aos seus. Ele é, dali. Imagine fazer uma ficção científica num ambiente desses. É a ousada proposta de Queirós. Misturando documentário e cinema de gênero, o filme decola numa ação policial, num baile funk. Uma batida da polícia degenera em violência e marca a vida de dois jovens. Passam-se 30 anos e a Brasília periférica e futurista tem algo de Berlim da Guerra Fria. A cidade é dividida em zonas. É preciso passaporte para cruzar as 'fronteiras'.

Um dos jovens perdeu a perna - e usa perna mecânica. O outro está numa cadeira de rodas. Nada disso é representação. Marquim do Tropa e Shockito não precisam mais que das próprias vivências para contar a história daquela noite fatídica. Do futuro vem o exterminador que não se parece em nada com Arnold Schwarzenegger na série famosa de James Cameron. Dimas Cravalanças (Dilmar Durões) vem cobrar do Estado brasileiro as atrocidades cometidas contra negros, pardos e pobres da quebrada.

Pode-se gostar mais de um, ou de outro. Não importa. São filmes viscerais. Queirós fez carreira na várzea e, depois, jogando futebol em equipes modestas. Estudou cinema na UnB e, como ele próprio diz, entrou para a universidade para arrumar umas namoradas. Criou um coletivo de cinema em Ceilândia. Com A Cidade É Uma Só?, venceu a Mostra Aurora de 2012. O coletivo surgiu para discutir e viabilizar o cinema que Queirós e seus amigos queriam/querem fazer, mas virou um foro maior para discutir... Tudo - questões de gênero, de cor, de território. Em Tiradentes, o diretor explicou que seu cinema é documentado. Foram anos de pesquisa - três ou quatro - para fazer Branco Sai Preto Fica.

Como conciliar cinema documentado e realista com fantasia científica? A máquina do tempo de Adirley Queirós é um contêiner. Os diálogos são previamente preparados para que os atores, que também são personagens, improvisem diante da câmera. Filmes como esses dois representam uma alternativa criativa e politizada não apenas para a quebrada - a periferia - como para o próprio cinema brasileiro, que também é periférico para Hollywood (e isso no próprio mercado). É a segunda edição do Festival de Direitos Humanos Cidadania nas Ruas. Prossegue até domingo em diferentes pontos de São Paulo.

Fonte: Estadão Conteúdo
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