23/01/2022 09h40
De spray a pílula, cientistas já miram 2ª geração de vacinas contra a covid
Em formato de pÃlulas, sprays nasais ou à prova de variantes: a segunda geração de vacinas contra a covid-19 está a caminho - e elas podem ser ainda melhores. O surgimento de variantes altamente transmissÃveis, como a Ômicron, e a perspectiva de que o mundo terá de conviver com o coronavÃrus impulsionam pesquisas nessa área. Por outro lado, barreiras como a falta de insumos e até a dificuldade de recrutar voluntários atrasam resultados.
Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) mostram que há 140 imunizantes em fase de estudo clÃnico - quando a vacina é testada em humanos - e 194 em estágio pré-clÃnico, com testes em animais. A lista inclui candidatas brasileiras e, no caso das nacionais, a expectativa é de que fiquem prontas no inÃcio do ano que vem.
Imunizantes hoje à disposição vêm cumprindo muito bem sua função principal: prevenir o adoecimento e a morte. Apesar disso, cientistas em todo o mundo veem um campo aberto para marcar novos gols contra a covid-19.
O desenrolar da pandemia já deixou claro que as vacinas podem ser aprimoradas para reduzir infecções e transmissão. Hoje, especialmente com a Ômicron, vacinados se infectam e transmitem, ainda que em escala menor do que não imunizados. O avanço da variante fez a Coalizão Internacional de Autoridades Reguladoras de Medicamentos convocar uma reunião para debater "estratégias de longo prazo" sobre tipos de vacinas necessárias para gerenciar a covid-19.
"Uma das razões pela qual a Ômicron é tão transmissÃvel é que muita gente já vacinada tem o vÃrus (alojado) no nariz, mas é assintomático", diz o pesquisador da Universidade de São Paulo (USP), Jorge Kalil. O cientista quer armar o organismo contra o Sars-Cov-2 antes que ele invada e se multiplique pelo corpo. Por isso, desenvolveu uma vacina de spray nasal - poucas com este método estão em teste no mundo.
"O gol final é ter uma vacina de imunidade esterilizante, aquela que gera tantos anticorpos na porta de entrada, de forma que o vÃrus praticamente não infecta. Mas isso é difÃcil de alcançar", diz o virologista Fernando Spilki, da Universidade Feevale e membro do comitê de especialistas da Rede VÃrus, do Ministério da Ciência e Tecnologia. De toda forma, tecnologias como a do spray nasal podem, se não barrar totalmente a entrada do Sars-Cov-2, reduzir o alcance, diminuindo o contágio.
E, embora não tenham efeito direto no nariz, vacinas injetáveis, no braço, também diminuem a transmissão porque evitam a replicação do vÃrus dentro do corpo. Essa função é melhor desempenhada à medida em que o imunizante é capaz de atacar de forma certeira a variante em circulação.
"Vamos continuar dando dose de reforço a quem perde parte da proteção, mas o ideal é conseguir vacinas melhores, inclusive para prevenir formas leves", diz Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações. Com a Ômicron, é possÃvel que vacinas disponÃveis se atualizem para cumprir melhor esse papel - farmacêuticas já engatilharam isso.
MUTAÇÕES
Outros estudos em teste miram evitar o problema das mutações, com vacinas "à prova de variantes" - mais uma meta difÃcil de alcançar. Uma das tentativas é da empresa americana Gritstone bio, que projetou um produto com foco nas células assassinas de estruturas infectadas pelo vÃrus. O CEO André Allen diz que a vacina é um primeiro passo para desenvolver um imunizante "pancoronavÃrus".
Já em teste em brasileiros, uma vacina desenvolvida pelo Senai Cimatec, em parceria com a empresa americana HDT Bio Corp, aposta em alta proteção com baixÃssimas doses - até 30 vezes menores do que a da Pfizer. Isso é possÃvel porque o imunizante usa uma técnica para que o RNA - que contém informações para a sÃntese de proteÃnas - se autorreplique nas células.
Uma das possÃveis vantagens seria juntar, em uma só injeção, doses projetadas para cada uma das variantes - o fato de cada dose ser pequena facilitaria, em tese, criar esse "combo" sem causar tanta reação. "A expectativa para o futuro é que essa plataforma consiga ter o RNA de diferentes variantes por causa da tecnologia de baixÃssimas doses. Talvez seja possÃvel ter uma vacina multivalente", diz a pesquisadora Bruna Machado, lÃder técnica do projeto no Senai Cimatec.
Outras vacinas da segunda geração estão mais adiantadas: a da americana Novavax, por exemplo, foi aprovada na Europa. Sem usar tecnologia de RNA mensageiro, é uma aposta para convencer quem ainda resiste a se vacinar. Já contra o medo das agulhas, há propostas como a da Vaxart, na Califórnia, que criou uma vacina em forma de pÃlula e começou testes em humanos.
Além da possibilidade aumentar a proteção na mucosa da boca, outra vantagem seria a facilidade de transporte e administração. Desenvolvimentos de vacinas levam em conta, agora, não só o nÃvel de proteção, mas o quanto podem melhorar as campanhas.
Novas vacinas para reforço com proteção de maior duração podem ampliar, por exemplo, os prazos para revacinação. A Agência Europeia de Medicamentos já deixou claro ao dizer, em comunicado semana passada, que aplicar doses de reforço em intervalos curtos não é uma "abordagem sustentável" a longo prazo. O reforço demanda alto investimento - e nem sempre tem boa adesão.
DESAFIOS
Pesquisas da 2ª geração de vacinas encontram entraves logÃsticos e financeiros. A pesquisa da vacina de spray nasal, por exemplo, do cientista da USP Jorge Kalil, está travada pela dificuldade de conseguir lotes piloto para ensaios em seres humanos. Não há como fabricá-los no Brasil.
Outra vacina em parceria com pesquisadores da USP, a Versamune, também atrasou. "Houve escassez geral: de luvas a frascos para envases", diz Helena Faccioli, CEO da Farmacore. Além disso, estudos precisam ser constantemente redesenhados diante da falta de voluntários não vacinados. Especialistas, no entanto, são otimistas: as pesquisas podem servir não só para a covid, mas para melhorar vacinas que já temos e encontrar soluções para doenças ainda sem prevenção.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Fonte: Estadão Conteúdo