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Opinião
29/06/2011 10h09

O mar também traz história

opinião

Aproveitando o filão inesgotável de histórias concernente aos trens, narradas pelo inesquecível seu Borges, durante anos chefe da estação de Conservatória (RJ), resolvi recordá-lo trazendo um episódio que mereceu destaque, a mostrar o quanto de ingenuidade e lirismo aquela gente interiorana era dotado.
Contava seu Borges que, por ser aquele ramal férreo o único que chegava ao litoral através da cidade de Angra dos Reis, – portanto, era por ele que os sul-mineiros passavam a conhecer o mar de forma mais rápida e barata. Tornava-se prática comum aos passageiros, mormente os deslumbrados, a trazerem como suvenir garrafas e garrafões contendo água do mar. Esse hábito de procedimento estranho, afinal não é líquido potável e não tem qualquer serventia, seu Borges intrigado e curioso por querer saber o motivo, aproveitou quando houve um entrevero entre dois passageiros em que a causa deveu-se pela quebra de uma dessa garrafas, para matar a curiosidade. Solicitado pelo chefe do trem a tentar acalmar o bate-boca e apaziguar o ambiente, indagou do “prejudicado” o porquê da revolta por ter a garrafa perdida. Ainda possesso, o simplório homem, revelou que seria para mostrar aos amigos da cidade que conhecia o mar e aquela água era a prova. Seria o mesmo que matar a cobra e mostrar o pau. Sorrindo, procurando mostrar imparcialidade, embora a curiosidade houvesse sido revelada e óbvio, causando certo humor tal a ingenuidade, procurou acalmá-lo dizendo que colocasse numa garrafa, água comum e adicionasse sal. O cidadão surpreso com a sugestão, franzindo a testa arregalar os olhos, retrucou aborrecido vociferando que seria um mentiroso se assim procedesse. Além do mais, como teria a areia para ficar ao fundo da garrafa, se a nossa terra é constituída de barro vermelho?
Sem graça, seu Borges, um tanto desarticulado, tentou amenizar a situação dizendo que o sal é extraído do mar. Portanto, colocá-lo de volta à água seria o mesmo que apanhá-la no mar. Quanto a areia, bastava retirá-la do fundo de um rio. Dando de ombro, o homem saiu furioso a gesticular visivelmente contrariado por achar que o queriam transformar num mentiroso.
A partir de então, seu Borges resolveu providenciar algumas garrafas e as estocou à sua sala visando futuros contratempos e complicações. De fato aquela idéia foi providencial, pois outras garrafas foram preparadas dada a procura. O pior é que “espertos” passageiros passaram a pedir, alegando quebras e vazamentos. Lógico que o seu Borges sabia que era mentira, mas mesmo assim não negava o oferecimento. Só que descobriu que muitas delas estavam sendo negociadas nos seus municípios pelos tais “espertos”, bem caras. O que o levou acabar com a “farra”. Afinal, não queria ser conhecido como um espertalhão por explorar a ingenuidade dos interioranos sul-mineiros, e muito menos ter sua reputação afogada num “mar” de espertezas.

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