
Torquarto, o “sempre alerta”
Curtindo como sempre a estação férrea de São Lourenço, MG, lá estava àquela tarde a apreciar a movimentação das crianças que foram agraciadas com o passeio no Trem das Águas oferecido, como vez por outra ocorre nas escolas municipais, pela A.B.P.F (Associação Brasileira de Preservação Ferroviária) sob coordenação do Dr. Edelmo, cujas professoras com a difícil missão de cuidar, olhar, guiar e organizar seus alunos, se desdobram a fim de que tudo ocorra a bom termo, tal a euforia expressada pela meninada, onde a cada comportamento infantil era externado na alegria em participar ativamente do passeio.
Eu ali absorto àquela “confusão”, observando, a recordar-me da minha infância, de súbito sou surpreendido com a chegada de um “bem vivido” senhor que se pondo a conversar, fala da belíssima iniciativa em proporcionar aos pequenos estudantes, carentes ou não, de tamanha recriação de aspecto educativo e cultural. Virando-me a ele, óbvio que concordei e passamos a conversar.
Entre assuntos trocados, depois de identificar-se como um ex-ferroviário da Estação de Ferro Sorocabana, trouxe da memória um episódio; aproveitando daquele momento pueril que presenciávamos; que certa vez foi determinado pela companhia em conduzir um grupo de escoteiros e lobinhos (iniciantes no escoteirismo) a uma excursão ao interior paulista. O responsável pelo grupo dos lobinhos, Sr. Torquarto, acomodado ao vagão, no intuito de alegrar e distraí-los, resolveu dar início a uma brincadeira visando desanuviar a maçante e morosa viagem e evidente descontraí-los. Foi sugerido então o jogo dos casais, ou seja; dado o nome de um animal, teria de ser respondido o nome do seu par. E assim iniciavam o jogo com o primeiro a arguir perguntando quem era a fêmea do cavalo. A resposta foi dita; a égua. Aquele que respondeu, efetuou a pergunta a outro escolhido e assim foi se sucedendo entre acertos e erros, que eram corroborados por Torquarto e as dificuldades encontradas por ele eram também esclarecidas.
Com a brincadeira bem descontraída, de repente um dos lobinhos, por sinal parecia ser o mais novo do grupo, erguendo o braço, chama a atenção de Torquarto, que o atende indagando-o qual era o problema. O garotinho parecendo atônito e confuso, e com ar interrogativo, pergunta: -- Seu Torquarto, o senhor falou que o “marido” da vaca é o boi, então quem é a “mulher” do touro?
Surpreendido, a mostrar-se de “calça curta” diante da complicada pergunta, coça a cabeça meio sem ação, quando outro coleguinha responde que é a vaca!
O intrigado garotinho, sem que deixasse tempo a Torquarto responder, retruca dizendo e pergunta: -- Ué, a vaca tem dois “maridos”?
Nisso o grupo que àquela altura também se mostrava intrigado, volta-se a Torquarto querendo saber o porquê da confusão.
“Eu que assistia a tudo, notando a dificuldade do homem, resolvi ir a seu auxílio e passei a dividir com ele a “calça curta” que havia se metido e, procurando expor a realidade da vida aos jovens lobinhos, a dizer que o boi quando nasce é submetido ao corte do seu saquinho e torna-se castrado. Mas de acordo com o dono dos bezerrinhos, alguns não sofrem à retirada dos saquinhos e passam a ser considerados touros. O que lógico quando adultos podem produzir outros bezerros com as vacas. Aqueles que foram castrados continuam como bois e terão a tarefa de servir como animais de cargas, serviços e cortes às fazendas. Portanto, está ai o porquê da vaca ter dois “maridos”.
O azougue do garoto, não se dando por satisfeito, treplica: -- Então vou falar p’ra mamãe, para dizer a titia p’ra ela arranjar outro marido, pois se ela não tem filho é porque o tio não tem saguinho!
Sem poder conter o riso diante da inocente argumentação pueril, cuja jocosidade momentânea se abateu sobre ambos a se entreolharem, a brincadeira chegou ao fim.
E assim ampliamos nossa coletânea, com o episódio narrado por seu Reginaldo, um ex-ferroviário, que em boa hora cruzou os nossos trilhos galgando a plataforma da estação de São Lourenço com uma história bem deliciosa e digna em cronicá-la.
Com o adendo, diria que hoje em pleno século XXI, estes sorrisos transformar-se-iam em gostosas gargalhadas das crianças, pois a ingenuidade da inocência se extinguiu como as Marias-fumaça!