
Numa tarde de sábado, lá estava eu no interior da matriz de São Lourenço, apreensivo, pois aguardava notícias do estado de saúde do meu amigo e confidente monsenhor Barbosa, que no leito do hospital da Ordem da Penitência no Rio de Janeiro, sobre estado crítico, permanecia pelos desígnios de Deus ao mau que o afligia no alto dos 89 anos dedicados ao sacerdócio de uma vida pastoral, cuja bondade pautou em seus sentimentos por amor ao próximo.
Ali sentado, após orar pelo eterno amigo, a rogar a Deus por um desenlace em paz, sem sofrimentos e digno de um missionário que sempre soube conduzir o seu rebanho e apascentá-lo a levar o conforto espiritual àqueles que desgarrados necessitavam de ajuda, de súbito ergui-me do banco indo à direção da imagem do Cristo, onde me ajoelhei e quando contrito me fixei a ela, fui envolvido por uma brisa por inteiro e um perfume suave de aroma agradável, o qual me fez olhar a todas as direções e me surpreender ao notar que nada pudesse provocar tal sensação daquela aura. Voltando-me a imagem, fui tomado por uma tristeza seguida de uma angustia, onde no meu peito um aperto fez com que meus olhos se enchessem de lágrimas, que caíram pela face. Erguendo-me do genuflexório, enxugando o rosto, penetrei à sala do Santíssimo, em que diante do sacrário simbolizando a presença de Deus, agradeci por interceder no meu, talvez cruel pedido, a clamar que o levasse para junto de ti a viver a vida eterna.
Caminhando pela nave da matriz, triste e conformado, optei por sentar-me e ali fiquei a recordar os momentos que tivemos a prosear no Convento d´Ajuda, quando em meio ao silêncio reinante, passei a ouvir os apitos do Trem das Águas, que pela hora; 16:30, retornava do passeio turístico a Soledade de Minas. Aqueles apitos fizeram com que fluíssem da memória mais recordações e óbvio, mais saudades de Barbosa, onde teve o trem durante anos como seu condutor nas suas incansáveis andanças pastoral, cuja abnegação imbuída da bondade e ternura no atendimento desprovido de qualquer contrariedade, a nunca deixar de atender um irmão necessitado; a hora que fosse, a ponto de ser reconhecido e chamado de “São Barbosa”, mesmo que esse chamamento ser por ele considerado uma heresia, mas que perdoava e aceitava como forma carinhosa expressada pelos irmãos interioranos fluminenses.
O tempo passou e de repente os sinos começam a tocar, a chamar os fiéis à missa 18:00hs. Deixando a matriz, segui para casa que ao chegar o telefone tocou. Ao atendê-lo, era do Rio de Janeiro, mais precisamente do Convento d´Ajuda dando a notícia que monsenhor Barbosa havia nos deixado às 16:00hrs. Suas exéquias dar-se-iam no domingo após a missa de corpo presente das 08:00hs. Segundo as normas eclesiásticas, a cerimônia fúnebre só seria presenciada pelos parentes diretos, o clero e as internas. Mas de acordo com a vontade de Barbosa; deixado por documento, indicava três amigos a presenciá-la e, entre eles eu eram um dos beneficiados. Desligando o telefone, consternado, contei a minha mulher o que se passou e logo a seguir me dirigi a rodoviária a adquirir passagem para ônibus das 23:30hs com o retorno do Rio de Janeiro às 13:00hs, no que fui agraciado além de ter sido honrado por participar do adeus ao amigo, com uma medalha de São Bento, a qual me foi entregue pela Madre Superiora do convento ao chegar às exéquias, que mantenho junto a mim, deixada por Barbosa com bela mensagem despedindo-se de mim a considerar-me um grande e fraterno amigo.
Hoje, 8 anos se passaram e sinto sua presença como vivo estivesse, escrevendo seus episódios onde o trem se faz presente nas inúmeras crônicas, as quais venho expondo nesse cantinho da segunda página aos leitores do nosso jornal; Correio do Papagaio há 5 anos ininterruptos.