
Há coisas que ocorrem a vida da gente, que se contadas, duvidaremos ser considerada verídica tal a perplexidade do fato, atribuindo apenas como uma invencionice mentirosa, no intuito de se querer aparecer junto aos que são integradas a narrativa pelo inusitado, dito, duvidoso acontecido.
Após desembarcar do ônibus noturno das 23:50hs que me conduziu de São Lourenço ao Rio de Janeiro, como habitualmente procedo, me dirigi ao 2° piso aos toaletes da rodoviária visando o natural asseio matinal, já que meus afazeres a serem cumpridos demandariam em grande atividade, pois retornaria de regresso pelo ônibus das 16 horas. Mesmo sendo quase 5 horas da manhã, a movimentação do local era bem expressiva, claro, não tanto quanto o rotineiro fluxo durante o decorrer do dia em si.
Seguindo ao 2° andar, cheguei à entrada de um dos sanitários, onde me identificando a roleteira – prática paga usada aqueles que se servem dos toaletes - tive o acesso me dirigindo a ala dos box dos mictórios. O local bem cuidado, limpo e asseado, não havia ninguém. Já na bancada das pias depois de lavar o rosto, escovar os dentes e providenciar a troca de camisa, sou surpreendido com a entrada apressada ao recinto, de um cidadão de meia idade, que me cumprimentando, dirige-se a um dos box, onde apoiou sua mala sobre a prateleira e, num suspiro de alívio pôs-se a urinar. Enquanto isso, eu enfrente do espelho me ajeitava penteando-me, e dava os últimos retoques no visual“amassado” de quem havia passado uma noite mal dormida de cochilos e madornas entre os intervalos das três paradas do ônibus até o Rio de Janeiro.
Arrumando a pequena maleta, ao fechá-la, sou aturdido por um grito lancinante a ecoar por toda área. Olhando pelo espelho, vejo o cidadão se curvando sobre si mesmo a urrar e apedir ajuda em total desespero a ponto de se deixar cair de joelhos, a se contorcer de dor. Corri em seu socorro e deparei com um sangramento que se fazia, oriundo do baixo ventre, cujas mãos toldadas pelo sangue bem demonstrava que algo de grave acontecera. Imaginei tratar-se de um assalto com uso de arma branca. Ao me aproximar o indaguei o que ocorreu. Entre a aflição, desespero e urros, quase inaudível disse que se descuidou ao pegar a mala e com a outra mão acionou o zíper da braguilha, sem notar que o “bilau” estivesse acomodado ao interior da calça e aconteceu o pior, no que puxou rápido e forte o maldito fecho.
Vendo seu suplício, acorri às zeladoras a solicitar ajuda com a presença do socorro. As serviçais um tanto apavoradas a esboçarem ares de risos, correm ao interior do toalete, com uma delas retornando apressada em busca do atendimento médico, me deixando ali a interditar a entrada de alguém.
Não demorou, surgem um médico e uma acompanhante, onde os levei ao acidentado. Com alguma dificuldade o colocaram deitado de dorso, onde constatado o ferimento, que com certa habilidade foi cortada a calça, e colocado sobre a genitália uma toalha com aplicação injetável de sedativos, a solicitar da auxiliar que fosse providenciada a maca, vez que ali seria inadequado realizar o socorro necessário. Rapidamente por dois seguranças, chega a maca onde o desafortunado é colocado sob gemidos e coberto por lençol, sendo conduzido ao ambulatório seguido pelo médico, a auxiliar e os dois seguranças a empurrar a maca com o homem e sua mala.
Deixando o local, sai à direção da praça de alimentação, onde um bom café se fazia necessário e fiquei aimaginar como aquele cidadão estaria agora sendo atendido e, óbvio, qual seria o seu novo destino, vez que num diálogo com o médico, disse que pegaria o ônibus das 6 horas à cidade de Pau Grande – RJ, afim de conhecer, pois sonhava com isso desde criança, a terra do famoso Manoel dos Santos, o “imortal” Garrincha, vez que vinha da cidade de Espera Feliz – MG, onde morava.
Moral da História: Todo cuidado é pouco quando estamos relaxados e tomados pela euforia que nos deixa momentaneamente acima de possíveis consequências, às vezes complicadas, até num simples ato de acionar um zíper.
Ah... Esses turistas ao verem-se em situações críticas e dolorosas, não passam de unspitorescos diante de instantes os quais quando narramos, sempre serão duvidosos a quem não presenciou um incrível infortúnio, em que um zíper fez mudar o destino de um botafoguense sonhador, acredito, pelo menos no aspecto em não poder conhecer a terra do Mané; ou seja, Pau Grande!
NC- Os locais aqui citados são verdadeiros.