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27/08/2014 11h43

Longa 'Um Belo Domingo' reinventa a estrada

Pierre Rochefort tinha 5 anos quando foi filmado pela primeira vez por sua mãe, no curta 15 de Agosto. Nicole Garcia iniciava-se na carreira de diretora, que acumula com a de atriz. Ela poderia ter feito a mãe de Baptiste, o personagem que seu filho interpreta em Um Belo Domingo, mas quem faz o papel é Dominique Sanda, a mítica estrela que dançou, em O Conformista, o primeiro tango em Paris de Bernardo Bertolucci. Numa conversa com o repórter, no Rio, quando veio participar do Festival Varilux de Cinema Francês, no primeiro semestre, Nicole justificou sua escolha - “Para criar aquela personagem, eu teria de fazer uma composição. Dominique é imperial com naturalidade. Emana dela uma força e até uma amargura que eu teria de trabalhar, para ser convincente.”

A participação de Dominique Sanda não é o menor dos atrativos de Um Belo Domingo. Cabe o superlativo - belíssimo. “Em 2006, fui jurada no Festival de Deauville e assisti a um filme com Ryan Gosling que me encantou (Half Nelson). Ele fazia um professor substituto. É o tipo do personagem que me atrai. Alguém idealista, porque é preciso ter uma dose de idealismo para querer trabalhar com jovens. Sem amarras. Sempre quis fazer um filme com um personagem desses na França. E, observando Pierre (Rochefort), eu sentia que ele poderia ser esse homem.

Trabalhava num roteiro com Jacques Fieschi, que tem sido meu parceiro. O projeto não andou. E aí me veio a vontade de fazer aquele filme que guardava na manga, e fazê-lo dentro de uma economia de cinema diversa daquela com que trabalhava.”

Um filme barato, de estrada. Começa por um simples olhar. Na véspera do feriado de Pentecostes, Baptiste remarca esse aluno que espera na porta da escola. O pai tem compromisso, ele toma o menino sob sua guarda no fim de semana prolongado. Matias, a pretexto de querer ir à praia, o leva onde está sua mãe, que é garçonete num restaurante à beira-mar. Baptiste se envolve com mãe e filho. Ela deve dinheiro - dois sicários a perseguem com ameaças. “Com Jacques, tenho meu método de trabalhar”, explica Nicole. “Nunca penso no tema que quero abordar. O personagem vem primeiro, e aí eu me pergunto, e Jacques me ajuda a responder, por que quero esse homem, ou essa mulher, em frente à minha câmera.”

Discutem as cenas, mais que a história. “Jacques escreve, eu corrijo.” Ator e cantor, Pierre Rochefort transmite bem a tensão inclusive física, que consome Baptiste. Louise Bourgoin, que faz a mãe de Matias, Sandra, é uma estrela na França. Aceitou a personagem sem glamour, sem maquiagem. Baptiste tem um segredo - é de família rica. O filme nunca esclarece completamente que vazio ou mal-estar existencial o colocou na estrada. Só persiste aquela mágoa da família, que o internou quando ele teve seu colapso emocional. Mas agora Baptiste volta aos seus, em busca do dinheiro para ajudar Sandra. “Ela é um pouco como ele. Sem raízes, desligada da questão do dinheiro. Ele tem muito, e não quer. Sandra não tem nada, e precisa. Jacques assinalou - ‘Lá vem você com o dinheiro, de novo.’ É verdade. O dinheiro, para mim, tem esse aspecto revelador do caráter. E, em geral, são as mulheres que mais precisam dele.”

Não fazendo cinema rigorosamente autobiográfico, Nicole admite que suas experiências pessoais enriquecem a ficção. “Havia visitado aquela praia particular há alguns anos e imediatamente soube que um dia ia filmar ali.” A trilha de Eric Neveux é romanesca. “Ajuda a ficcionalizar o que é íntimo para mim, mas para penetrar no mistério de Baptiste e sua mãe, utilizei música preexistente. As Variações Enigmáticas de Elgar e, no fim, a canção Sugar Me. Gosto desse final que não é conclusivo, quando Sandra responde o que fez no fim, de semana - ‘Conheci un mec, um cara.’ As histórias muito fechadas me aborrecem.”

Para personagens tão nômades, a casa vira essencial. “Para Baptiste, é o lugar do seu sofrimento. Ele volta e sabe que não pertence mais a esse mundo, não importa o que diz o irmão, que o reprova por rejeitar a herança. Mais até que em meus outros filmes, a luz é muito importante. A luminosidade do sul, carregada de erotismo. Trabalhei muito com meu fotógrafo (Pierre Milon) os contrastes de luz e sombra.” Nicole Garcia está mais segura, como diretora. O Filho Preferido, Place Vendôme e O Adversário foram degraus nesse processo de amadurecimento. Sua direção privilegia os olhares que as mulheres portam sobre Baptiste - Sandra, a mãe, a irmã, a mãe diretora atrás da câmera. O assunto cai em Alain Resnais, que a dirigiu em Meu Tio da América, no começo dos anos 1980, e havia morrido há pouco (em 1.º de março). Ela faz uma confissão inesperada. Disse que teve um flerte com o diretor. “Se ele me tivesse feito sua musa, não teria virado diretora.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

fonte: Estadão Conteudo

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