15/02/2021 18h30
Novo 'Poderoso Chefão', que Coppola reeditou e melhorou, chega aos cinemas
No inÃcio do ano, quando os estúdios Paramount anunciaram que o diretor Francis Ford Coppola retrabalharia o filme O Poderoso Chefão III, criou-se uma grande expectativa. Afinal, o longa rodado em 1990 é considerado o pior da trilogia sobre a famÃlia Corleone, muito aquém das duas primeiras partes que são obras-primas. Desde a pálida atuação da filha do diretor, Sofia Coppola (hoje, uma renomada cineasta), até o desfecho insatisfatório, o filme deixava a desejar.
Não mais - a partir desta quinta, 3, quando O Poderoso Chefão - Desfecho: A Morte de Michael Corleone estreia nas salas de cinema (e, no dia 8, chega à s plataformas digitais), Coppola não apenas recupera seu trabalho como finalmente oferece o longa que desejava. O próprio diretor, aliás, aparece antes do inÃcio da projeção, explicando suas escolhas. "Graças à gentileza da Paramount Pictures de me deixar revisitar esse projeto, eu o reeditei e dei a ele um tÃtulo que não é exatamente novo, mas é o tÃtulo original", comenta.
Coppola foi, na verdade, diplomático ao se referir à bondade do estúdio - a produção foi acidentada e a Paramount não aceitou que o longa tivesse como subtÃtulo A Morte de Michael Corleone, como desejavam Coppola e o roteirista Mario Puzo. O estúdio também ofereceu um salário minguado para Robert Duvall, excelente como o conselheiro da famÃlia Corleone, Tom Hagen - naquelas condições, o ator não aceitou participar do filme. Assim, era inevitável a fraca recepção (se comparada à s sequências anteriores) e ao fracasso no Oscar: apesar das sete indicações, não venceu em nenhuma.
No tÃtulo original, consta a palavra "coda" que, em português, se transformou em "desfecho". "Em termos musicais, uma coda é uma espécie de desfecho. É um resumo. E era isso que gostarÃamos que esse filme fosse. Você verá um filme com um começo diferente, um final diferente. Muitas cenas foram reposicionadas e penso que o filme ganhou uma nova vida. O que, de fato, serve para elucidar o que os dois primeiros filmes significaram", continua o diretor, quase irreconhecÃvel, pois está mais magro, com a barba grisalha.
De fato, comparada ao longa que estreou em 1990, a nova versão começa exatamente com a cena que, na anterior, surge quando já foram transcorridos 40 minutos de projeção. Com isso, Coppola foca precisamente na relação insidiosa entre o poder da Igreja e o dinheiro corrompido. Se os minutos iniciais antes reforçavam a importância da famÃlia e da religião para os Corleones até chegar à quele ponto, o cineasta, que hoje está com 81 anos, torna a relação o ponto central da trama.
É curioso como Coppola não escondeu, ao longo dos anos, sua insatisfação com as decisões unilaterais do estúdio em relação ao tÃtulo do filme e também com a forma com que a trama é inicialmente narrada - em comentários que figuram em versões em DVD de O Poderoso Chefão III, o diretor explicita sua decepção com a falta de liberdade criativa ("naquela época, meu poder de decisão estava em baixa") e revela que pretendia iniciar a narrativa com a cena que ora figura na nova versão, "em que o arcebispo Gilday (Donal Donnelly) relata a Michael Corleone (Al Pacino) como o Vaticano teria se metido em dificuldades financeiras".
Coppola conta que seu colaborador Walter Murch, porém, sugeriu que seria melhor tratar antes da vida familiar e particular e depois entrar nos negócios. "Em vez de dizer não é nada pessoal, são apenas negócios, é como se dissesse não são negócios, mas assuntos pessoais, o que definiria melhor a postura de Don Corleone. Então, decidimos começar com a cerimônia em que Michael é condecorado pela Igreja pelas generosas doações."
Com o novo formato, o longa que, ao longo dos anos foi criticado pelo desenvolvimento lento e que mais parecia uma recauchutagem de seus predecessores imaculados, ganhou mais agilidade e precisão. E, ao reposicionar a cena (que, de uma certa forma, remete ao inÃcio do pioneiro O Poderoso Chefão), Coppola acerta ao deixar à s claras a intenção do mafioso: Michael está saldando a dÃvida da Igreja Católica para legitimar os negócios da famÃlia Corleone e, não à toa, se tornar um dos homens mais ricos do mundo. Por ser um filme pródigo em excelentes diálogos, a cena termina com Gilday se lamentando: "Parece que, no mundo de hoje, o poder de absolver dÃvidas é maior que o poder de perdoar". Ao que Michael retruca: "Nunca subestime o poder do perdão".
Naquela fase da vida, Michael é um homem atormentado e em crise - exatamente como Coppola, no inÃcio dos anos 1990, quando acumulava fracassos e despertava a desconfiança da crÃtica, que previa encerrado seu talento. "Foi um momento em que me sentia como ele, tentando entender o que era mais importante que fama e dinheiro, e, ao decidir fazer o terceiro filme, só poderia ser com um Michael Corleone mais velho. Naquela época, eu já sabia, como ele, que a realização é ver os filhos e a famÃlia prosperarem."
É em busca disso que Michael luta, no final da existência. Para isso, aceita a contragosto a carreira de cantor de ópera do filho Tony (Franc DAmbrosio) e concede à filha Mary (Sofia Coppola) a presidência do instituto beneficente da famÃlia. Depois de uma vida cumprindo à risca as regras de um jogo de poder (em que se sentiu obrigado até a matar um de seus irmãos), Michael busca a expiação e, quem sabe, paz.
Coppola também alterou o final do filme, que não convém aqui revelar. Apenas não foi possÃvel "melhorar" a interpretação de Sofia. Em sua defesa, porém, a atriz Diane Keaton, que vive Kay, ex-mulher de Michael, disse, ao ver a nova montagem: "Mary tem como pai o lÃder de uma organização criminosa. É insegura, quieta, um tanto assombrada. Sofia foi fantástica".
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Fonte: Estadão Conteúdo